Jesus estabeleceu a verdadeira ordem para
o trabalho espiritual!!!
Henry Nouwen
A palavra discipulado
e a palavra disciplina são a mesma palavra – isso sempre me fascinou. Uma vez
que você fez a escolha de dizer “Sim, eu quero seguir a Jesus”, a questão é,
“Quais são as disciplinas que me ajudarão a permanecer fiel a esta escolha?”.
Se quisermos ser discípulos de Jesus, temos que viver uma vida disciplinada.
Ao falar disciplina,
não quero dizer controle. Se eu conhecer a disciplina de psicologia ou de economia,
tenho certo controle sobre um conjunto de conhecimentos. Se eu disciplinar meus
filhos, quero ter um pouco de controle sobre eles. Na vida espiritual, porém, a
palavra disciplina significa “o esforço para criar um pouco de espaço no qual
Deus pode agir”. Disciplina significa evitar que tudo na sua vida seja
preenchido. Disciplina significa que em algum lugar você não está ocupado, e
certamente não preocupado. Na vida espiritual, a disciplina significa criar
aquele espaço no qual algo, que você não havia planejado ou esperado, pode
acontecer.
Eu acho que existem
três disciplinas para permanecermos fiéis, a fim de que não apenas nos tornemos
discípulos, mas também permaneçamos discípulos. Essas disciplinas estão numa só
passagem da Escritura, que apesar de nos ser familiar, pode nos surpreender ao
descobrirmos que fala sobre disciplina.
Naqueles dias, retirou- se para o monte, a fim de orar, e
passou a noite orando a Deus. E, quando amanheceu, chamou a si os seus
discípulos e escolheu doze dentre eles, aos quais deu também o nome de
apóstolos: Simão, a quem acrescentou o nome de Pedro, e André, seu irmão; Tiago
e João; Filipe e Bartolomeu; Mateus e Tomé; Tiago, filho de Alfeu, e Simão,
chamado Zelote; Judas, filho de Tiago, e Judas Iscariotes, que se tornou
traidor. E, descendo com eles, parou numa planura onde se encontravam muitos
discípulos seus e grande multidão do povo, de toda a Judéia, de Jerusalém e do
litoral de Tiro e de Sidom, que vieram para o ouvirem e serem curados de suas
enfermidades; também os atormentados por espíritos imundos eram curados. E
todos da multidão procuravam tocá-lo, porque dele saía poder; e curava todos.
(Luc 6:12-19).
Essa é uma história
linda que se passa da noite para a manhã e depois para a tarde. Jesus passou a
noite em solitude com Deus. Ao amanhecer, ele juntou seus apóstolos em sua
volta, formando uma comunidade. E ao entardecer, com seus discípulos, ele saiu,
pregou a palavra e curou os enfermos.
Observe a ordem: Da
solitude para a comunidade e depois para o ministério. A noite é para a
solitude; a manhã para a comunidade; e a tarde para o ministério.
Frequentemente, no
ministério, tinha o desejo de fazer as coisas sozinho. Se isso não funcionasse,
me achegava a outras pessoas e dizia, “Por favor!”, procurando uma comunidade
para me ajudar, e se isso não funcionasse, talvez, começaria a orar.
Mas a ordem que Jesus
nos ensina é a inversa. Começa estando com Deus em solitude; então se cria uma
comunhão, uma comunidade de pessoas com a qual a missão está sendo vivida; e
finalmente essa comunidade sai junta para curar e para proclamar as boas novas.
Eu acredito que podemos olhar para a solitude, para a
comunidade, e para o ministério como sendo três disciplinas pelas quais criamos
espaço para Deus. Se criarmos espaço no qual Deus pode agir e falar, algo
surpreendente acontecerá. Você e eu somos chamados à essas disciplinas se
quisermos ser discípulos.
SOLITUDE
Solitude é estar com Deus e
somente Deus. Existe algum espaço para isso em sua vida?
Por que é tão importante que você
esteja com Deus e apenas Deus no monte? É importante, porque é o lugar no qual
você pode ouvir a voz daquele que te chama de amado. Orar é escutar aquele que
te chama de “minha filha amada”, “meu filho amado”, “minha criança amada”. Orar
é deixar que aquela voz fale ao centro do seu ser, ao seu âmago, é deixar que
aquela voz ecoe em seu ser inteiro.
Quem sou eu? Eu sou o amado. Essa
foi a voz que Jesus ouviu quando saiu do rio Jordão: “Tu és meu filho amado, em
ti me comprazo”. E Jesus diz a mim e a você que somos amados como ele é amado.
A mesma voz está lá para você. Quando você não estiver reivindicando essa voz,
não pode andar livremente neste mundo.
Jesus escutava essa voz o tempo todo, e foi capaz de andar corretamente
pela vida.
Pessoas estavam lhe aplaudindo, mas
também rindo dele, o louvando e o rejeitando; clamando “Hosana!” e clamando
“Crucifica-o!” Mas no meio disto, Jesus sabia de uma coisa: Eu sou o amado;
Eu sou o favorito de Deus. Ele se agarrava àquela voz.
Existem muitas outras vozes gritando: “prove que você é o amado”; “prove
que você vale algo”; “prove que tem alguma contribuição a fazer”; “faça algo
relevante”; “faça um nome para si”; “pelo menos tenha um pouco de poder, e então
as pessoas te amarão; então as pessoas dirão que você é maravilhoso, que você é
grande”.
Essas vozes são tão fortes neste
mundo. Essas foram as vozes que Jesus ouviu logo após ouvir de Deus, “Tu és meu
amado”. Outra voz disse: “Prove que você é o amado. Faça algo. Transforme as
pedras em pão. Certifique-se que é famoso. Pule do templo, e será conhecido. Se
aposse de um pouco de poder para que tenha influência verdadeira. Não deseja um
pouco de influência? Não foi para isso que veio?
Disse Jesus: “Não, eu não tenho
nada a provar. Eu já sou o amado”.
Eu amo o quadro de Rembrandt O Retorno do Filho Pródigo (The
Return of the Prodigal Son). O pai abraça seu filho, abraça sua filha, ele toca
em seu filho e sua filha e diz: “Vocês são meus amados. Não vou perguntar nada
a vocês. Onde estiveram, o que fizeram, e o que dizem sobre vocês, pois são meus
amados. Eu os mantenho seguros em meu abraço. Toco-lhes. Encubro-os em segurança
debaixo de minhas asas. Podem vir para casa e para mim, cujo nome é Compassivo,
cujo nome é Amor”.
Se você mantiver isso em seu
pensamento, pode lidar com uma quantidade enorme de sucesso, tão bem quanto uma
quantidade enorme de derrotas, sem perder sua identidade, porque a sua
identidade está em você ser o amado de Deus. Bem antes de seu pai e sua mãe,
seus irmãos e irmãs, seus professores, sua igreja, ou de qualquer pessoa lhe
tocar de uma maneira amável, assim como de uma forma que te feriu – bem antes
de você ser rejeitado ou louvado por outro – aquela voz sempre esteve lá. “Eu
tenho te amado com um amor eterno”. Esse amor estava lá antes de você nascer e
permanecerá lá após a sua morte.
Uma vida de cinquenta, sessenta,
setenta, ou de cem anos é apenas um instante em que você pode dizer. “Sim, eu
te amo também”. Deus tem se tornado tão vulnerável, tão pequeno, tão dependente,
numa manjedoura e numa cruz, e está nos perguntando: “Você me ama? Você me ama?
Você me ama de verdade?”.
É aí que começa o ministério,
porque a sua liberdade é ancorada em reivindicar esse estado de ser amado. Isso
permite que você entre neste mundo e toque em pessoas, as cure, fale com elas,
e faça com que estejam cientes de serem amadas, escolhidas, e abençoadas.
Quando você descobrir que é amado por Deus, vai enxergar o mesmo nas outras
pessoas, e mostrará isso a elas. É um mistério incrível do amor de Deus, que quanto
mais você sente a profundidade de ser amado, mais você enxergará quão
profundamente suas irmãs e seus irmãos na família humana são amados.
Agora, isso não é fácil. Jesus
passou a noite em
oração. Isso é um retrato do fato de que a oração não é algo que você sempre
sente. Não é uma voz que você sempre ouve com estes ouvidos. Não é sempre um
discernimento que subitamente chega a sua mente pequena. (O coração de Deus é
maior do que o coração do homem, a mente de Deus é maior do que a mente do
homem, e a luz de Deus é tão grande que pode te cegar e fazer você sentir como
se estivesse na noite.)
Mas você tem que orar. Você tem
que ouvir a voz que te chama de o amado, caso contrário você perambulará
esmolando por afirmação, por elogios, por sucesso. E então você não é livre.
Ah! Se pudéssemos nos assentar
por apenas meia hora por dia e não fazer nada a não ser tomar uma simples
palavra do evangelho e a colocar na nossa frente – por exemplo: “O Senhor é meu
pastor; nada me faltará”. Repita isso três vezes, e sabemos que não é verdade,
porque queremos muitas coisas, e achamos que temos falta delas. É exatamente
por isso que somos tão ansiosos. Porém, se permanecermos falando a verdade, a
verdade, “O Senhor é o meu pastor; nada me faltará”, e deixar que essa verdade
desça da nossa mente para o nosso coração, gradualmente essas palavras são
escritas nas paredes do nosso santo lugar interior. Esse lugar se torna o espaço
no qual podemos receber nossos colegas e nosso trabalho, nossa família e nossos
amigos, e as pessoas que encontraremos durante o dia.
O problema é que, tão logo você
se assenta e fica quieto, pensa, Ah eu esqueci, preciso ligar para meu
amigo. Mais tarde eu vou visitá-lo. A sua vida interior é como uma
bananeira cheia de macacos pulando para cima e para baixo.
Não é fácil sentar-se em solitude
e confiar que Deus falará com você, não com uma voz mágica, mas com a certeza
de que ele deixará você saber algo gradualmente através dos anos. E naquela
palavra você encontrará o lugar interior, a partir do qual viverá sua vida.
A solitude é onde o ministério
espiritual começa. É ali que Jesus ouviu a Deus. É ali que nós ouvimos a Deus.
Às vezes penso na vida como uma
gigantesca roda de bicicleta com muitos aros. No meio está o eixo.
Frequentemente, no ministério, parece que estamos correndo em volta do pneu, tentando
alcançar todo o mundo. Mas Deus diz, “Comece no eixo; viva no eixo. Então estará
ligado com os aros, e não terá que correr tão rapidamente”.
COMUNIDADE
É precisamente no eixo, naquela
comunhão com Deus, que descobrimos o chamado para a comunidade. É
extraordinário que a solitude sempre nos chama à comunidade. Em solitude você
percebe que é parte de uma família e que deseja levantar algo junto.
Por comunidade, não quero dizer comunidades formais. Refiro-me a famílias,
amigos, igrejas locais, programas de doze passos, grupos de oração. Comunidade não
é uma organização; comunidade é uma forma de viver: você junta ao seu redor
pessoas com quem você quer proclamar a verdade de que somos os filhos e filhas
amados de Deus.
Comunidade não é fácil. Uma vez
alguém disse: “Comunidade é um lugar onde mora a pessoa com quem você menos
deseja conviver”. Na comunidade dos doze apóstolos de Jesus, o último nome era daquele
que estava para lhe trair. Essa pessoa está sempre na sua comunidade, em algum
lugar; nos olhos de outros, você pode ser essa pessoa.
Eu morava numa comunidade chamada
Daybreak (Alvorecer), uma de mais de
cem comunidades no mundo inteiro, onde crianças, homens, e mulheres com incapacidades
mentais, junto com os seus cuidadores, moram juntos. Compartilhamos todos os
aspectos da vida cotidiana. Nathan, Janet, e todas as outras pessoas da nossa
comunidade sabem quão difícil e quão maravilhoso é viver juntos.
Porque é tão importante que a
solitude venha antes da comunidade? Por que se não soubermos que somos os
amados filhos e filhas de Deus, vamos esperar que alguém na comunidade nos faça
sentir assim. Eles não conseguem. Vamos esperar que alguém nos dê aquele amor
perfeito, incondicional. Mas comunidade não é solidão se agarrando à solidão:
“Estou tão sozinho e você está tão sozinho”. È solitude se agarrando à
solitude: “Eu sou o amado; você é o amado; juntos podemos construir um lar”. Às
vezes você está perto e isso é maravilhoso. Às vezes você não sente tanto o
amor, e isso é difícil. Mas podemos ser fiéis. Juntos podemos construir um lar
e criarmos espaço para Deus e os filhos de Deus.
Contidas dentro da disciplina da
comunidade estão as disciplinas de perdão e celebração. Perdão e celebração são
o que constroem a comunidade, quer seja um casamento, uma amizade, ou qualquer
outra forma de comunidade.
O que é perdão? Perdão é permitir
que a outra pessoa não seja Deus. Perdão declara: “Eu sei que você me ama,
porém não tem que me amar incondicionalmente, porque nenhum ser humano pode
fazer isso”.
Nós todos temos feridas. Estamos
todos sofrendo de uma grande dor. É precisamente esse sentimento de estar
sozinho que se esconde por trás de todos os nossos sucessos, aquele sentimento
de inutilidade que se esconde em baixo de todos os elogios, aquele sentimento
de insignificância, mesmo quando as pessoas dizem que somos fantásticos – é
isso que nos faz apegar-se às pessoas e esperar delas uma afeição e amor que
elas não podem dar.
Se quisermos receber de outras pessoas
aquilo que somente Deus pode nos dar, nos tornamos demônios. Dizemos, “Me ame!”,
e antes de perceber nos tornamos violentos, exigentes e manipuladores. É tão
importante permanecermos nos perdoando, não de vez em quando, mas em cada
momento da vida. Antes de tomar café da manhã, você já teve pelo menos três oportunidades
de perdoar pessoas, porque sua mente já está em ação, O que as
pessoas vão pensar de mim? O que ele ou ela vai fazer? Como eles vão me usar?
Perdoar outras pessoas por
poderem te oferecer apenas um pouco de amor é uma disciplina difícil. Continuar
pedindo perdão aos outros por você ser capaz de oferecer somente um pouco de
amor é uma disciplina difícil também. Dói dizer aos seus filhos, à sua esposa,
ao seu marido, aos seus amigos, que você não consegue lhes oferecer tudo que
gostaria de lhes dar. Mesmo assim, é aí que começa a ser criada a comunidade,
quando nos juntamos numa maneira perdoável e sem exigência.
É aqui que a celebração, a
segunda disciplina da comunidade, entra. Se você consegue perdoar outra pessoa
por não poder te dar aquilo que somente Deus pode te dar, então vai poder
celebrar o dom daquela pessoa. Então vai poder enxergar o amor que aquela
pessoa está lhe oferecendo como um reflexo do amor grande e incondicional de Deus.
“Amem uns aos outros porque eu vos amei primeiro”. Quando conhecermos aquele
primeiro amor, podemos enxergar o amor que chega a nós por meio das pessoas
como reflexo daquele amor. Podemos celebrar e declarar, “Nossa, isso é
maravilhoso!”
Na nossa comunidade, Daybreak, temos que perdoar muito. Porém,
em meio ao ato de perdoar vem a celebração: enxergamos a beleza de pessoas que
são frequentemente consideradas como marginais pela sociedade. Com perdão e
celebração, a comunidade se torna o lugar onde colocamos no centro os dons das
outras pessoas, as erguemos, e declaramos: “Você é a filha amada e o filho
amado”.
Celebrar o dom de outra pessoa não significa oferecer um ao outro pequenos
elogios – “Você toca melhor o piano”, “Você é bom em cantar”. Não, isso é um
show de talentos. Celebrar os dons de cada um significa aceitar a humanidade de cada um.
Nós vemos uns aos outros como uma
pessoa que pode sorrir, e dizer “bem vindo”, comer, e conseguir dar alguns
passos. Uma pessoa que nos olhos de outras é despedaçada está subitamente cheia
de vida, porque você descobre sua própria insuficiência por meio dela.
O que quero dizer é isto. Neste
mundo, tantas pessoas convivem com o peso da autorrejeição: “Eu não sou bom.
Sou inútil. As pessoas não se importam comigo realmente. Se eu não tivesse
dinheiro, não falariam comigo. Se eu não estivesse neste emprego importante,
não me ligariam. Se eu não tivesse tanta influência, não me amariam”. Por trás
de uma carreira bem-sucedida e altamente louvável pode estar uma pessoa medrosa
que não se considera muita coisa. Em comunidade aparece aquela vulnerabilidade
mútua na qual perdoamos uns aos outros e celebramos os dons de cada um juntos.
Tenho aprendido tanto desde que
cheguei ao Daybreak. Aprendi que meus
dons verdadeiros não são de escrever livros ou por ter frequentado
universidades. Meus dons verdadeiros são descobertos por Janet e Nathan e
outros que me conhecem tão bem que não podem mais ser impressionados por essas
outras coisas. De vez em quando eles dizem, “Tenho um bom conselho: Por que
você não lê alguns dos seus próprios livros?”
Há cura em ser conhecido na minha
vulnerabilidade e fraqueza. De repente percebo que Henri é uma pessoa boa
também aos olhos de pessoas que não leem livros e que não se importam com
sucesso. Essas pessoas podem me perdoar constantemente pelos pequenos gestos e
comportamentos egocêntricos que estão sempre presentes.
MINISTÉRIO
Todos os discípulos de Jesus são
chamados para o ministério. Ministério não é, em primeiro lugar, algo que se
faz (embora ele te leve a cumprir muitas coisas). Ministério é algo em que você
tem de confiar. Se você sabe que é o amado, e se você continua a perdoar
aqueles com quem forma comunidade e celebra os dons deles, você não pode estar
fazendo outra coisa que não ministrar.
Jesus curou pessoas não por fazer toda sorte de coisas complicadas. Um poder
saía dele, e todos eram curados. Ele não falou: “Me deixe falar contigo por dez
minutos, e talvez eu possa fazer algo sobre isso”. Todos que lhe tocaram foram
curados, porque um poder saía do seu puro coração. Ele queria uma coisa:
cumprir a vontade de Deus. Ele foi a pessoa completamente obediente, aquele que
estava sempre escutando a voz de Deus. Como resultado desse ouvir se deu uma
intimidade com Deus que radiava sobre todos a quem Jesus via e tocava.
Ministério significa que tem de
confiar nisso. Tem que acreditar que se é filho e filha de Deus, poder sairá de
você e pessoas serão curadas.
“Vão e curem os enfermos. Pisem
em cobras. Ressuscitem os mortos”. Isso não é conversa furada. Jesus ainda
disse: “Tudo que eu faço, vocês também podem fazer e coisas maiores”. Jesus
disse precisamente: “Vocês são enviados ao mundo assim como eu fui enviado ao
mundo, para curar enfermos”.
Confie nesse poder de cura.
Confie que se estiver vivendo como o amado você curará as pessoas quer perceba
ou não. Mas você precisa ser fiel a esse chamado! O ministério de cura pode ser
expresso em duas palavras: gratidão e compaixão.
A cura acontece frequentemente
por levar pessoas à gratidão, pois o mundo está cheio de ressentimento. O que é
ressentimento? Ira fria. “Estou irado com ele. Estou irado com isto. Não é
assim que quero”. Gradualmente existem mais e mais coisas sobre quais sou
negativo, e logo me torno uma pessoa ressentida.
Ressentimento faz com que você se
prenda a derrotas ou desapontamentos e reclame sobre as perdas na sua vida.
Nossas vidas estão cheias de perdas. Perdas de sonhos, perdas de amigos, perdas
de família e perdas de esperanças. Existe sempre o perigo que se move
furtivamente de que responderemos a essas dores incríveis em ressentimento.
Ressentimento nos dá um coração endurecido.
Jesus nos chama à gratidão. Ele
clama a nós: “Tolos, não sabiam que o Filho do Homem – que você, que nós – tem
de sofrer e depois entrar na glória? Não sabiam que essas dores eram dores de
parto que lhes levam à alegria? Não sabiam que tudo que experimentamos como
perda é lucro aos olhos de Deus? Aqueles que perdem suas vidas as ganharão. E
se o grão não morre, permanece um grão pequeno; porém se morrer, então
produzirá frutos”.
Você pode ser grato por tudo que
aconteceu em sua vida, não apenas pelas coisas boas, mas por tudo que lhe
trouxe até aqui? Foi a dor de um Filho que criou uma família de pessoas
conhecida como cristãos. Isso é o ministério de Deus.
Nosso ministério é ajudar
pessoas, gradualmente, a se livrarem do ressentimento, para descobrir que bem
no meio da dor há uma benção. Bem no meio das suas lágrimas é onde começa a
dança e a alegria é primeiramente sentida.
Neste mundo desvairado, existe
uma distinção enorme entre tempos bons e ruins, entre tristeza e alegria. Porém,
aos olhos de Deus, elas nunca estão separadas. Onde há dor, há cura. Onde há
lamentação, há dança. Onde há pobreza, há o reino.
Jesus diz: “Lamente sobre suas
dores e você verá que eu estou bem aí na suas lágrimas, e será grato pela minha
presença na sua fraqueza”. Ministério significa ajudar pessoas a serem gratos
pela vida mesmo estando com dores. Essa gratidão pode te mandar direto para os
lugares deste mundo onde as pessoas estão em dores. O ministro, o discípulo de
Jesus, vai por onde há dor não porque ele é um masoquista ou ela uma sádica,
mas porque Deus está escondido na dor.
“Bem aventurados os pobres”.
Jesus não diz: “Bem aventurados os que cuidam dos pobres”. Ele diz, “Bem
aventurados os pobres. Bem aventurados os que lamentam. Bem aventurados os que
têm dor. Lá estou eu”. Para ministrar, você tem que estar onde está a dor. Às
vezes essa dor está escondida numa pessoa que por fora pode parecer estar sem
dor ou ser bem sucedida.
Compaixão significa sofrer e viver
com aqueles que sofrem. Quando Jesus viu a mulher de Naim, percebeu que esta é uma viúva que perdeu seu
único filho, e foi movido pela compaixão. Ele sentiu a dor daquela mulher
no seu âmago. Ele sentiu a dor dela tão profundamente no seu espírito, que ele,
por compaixão, chamou o filho de volta a vida para que pudesse devolver aquele
filho à sua mãe.
Somos enviados para onde quer que
haja pobreza, solidão, e sofrimento para ter a coragem de estar com pessoas.
Confie que por se jogar em tal lugar de dor você encontrará a alegria de Jesus.
Todos os ministérios da história são construídos nessa visão. Um mundo novo cresce
por meio da compaixão.
Tenha compaixão como teu Pai no
céu tem compaixão. É um grande chamado. Mas não tenha medo, não se amedronte.
Não diga, “Eu não consigo fazer isso”.
Quando você está ciente que é o
amado, e quando tem amigos em sua volta com quem convive em comunidade, você
pode fazer qualquer coisa. Não está mais com medo. Não tem mais medo de bater
na porta enquanto alguém está morrendo. Não fica com medo de começar um diálogo
com uma pessoa que embora não pareça, está necessitando muito do ministério.
Você está livre.
Eu tenho experimentado isso
constantemente. Quando eu estava deprimido ou me sentia ansioso, eu sabia que
meus amigos não conseguiriam resolver isso. Aqueles que ministraram a mim foram
aqueles que não estavam com medo de estar comigo. Precisamente onde senti minha
pobreza, descobri a bênção de Deus.
Apenas algumas semanas atrás um
amigo meu morreu. Ele era um colega de classe e eles me enviaram a fita do seu
enterro. A primeira leitura do enterro era uma história de um riacho. O riacho
disse: “Eu posso me tornar um grande rio”. Ele trabalhou muito, mas havia uma
rocha enorme. O riacho disse: “Eu vou passar em volta desta rocha”. O riacho empurrou
e empurrou, e visto que tinha bastante força, ele passou em volta da rocha.
Logo o rio deu numa grande parede,
e o rio perseverou em empurrá-la. Eventualmente, o rio fez um canyon e cavou seu caminho. O rio
crescente disse: “Eu consigo. Eu consigo avançar. Não vou parar por nada”.
Então chegou a uma floresta
enorme. Disse o rio: “Vou avançar de qualquer jeito e simplesmente forçar estas
árvores a caírem”. E assim fez o rio.
O rio, agora poderoso, chegou à
beira de um deserto grande com o sol a pino. O rio disse: “Vou atravessar este
deserto”. Mas a areia quente logo começou a sugar o rio inteiro. Disse o rio:
“Ah não! Vou conseguir. Vou atravessar este deserto. “Mas o rio logo se esgotou
na areia até que se tornou num poço de lama.
Então o rio ouviu uma voz lá em
cima: “Simplesmente se entregue. Deixe-me carregá-lo. Deixe que eu cuide disso”. O rio respondeu: “Aqui estou eu”.
O sol, então, ergueu o rio e o
transformou em uma nuvem gigantesca. Ele levou o rio por sobre o deserto e
liberou as nuvens em forma de chuva e fez frutíferos e ricos os campos
afastados.
Existe um momento em nossa vida
quando enfrentamos o deserto e queremos fazer as coisas por nós mesmos. Mas
existe a voz que diz: “Larga disso. Se entregue. Vou te fazer frutífero. Sim,
confie em mim. Se entregue a mim”.
O que conta na minha e na sua
vida não é sucesso, mas os frutos. Os frutos da sua vida você pode não ver
pessoalmente. Os frutos da sua vida nascem, frequentemente, nas suas dores, na
suas vulnerabilidades e nas suas perdas. Os frutos da sua vida aparecem somente
após o arado cavar sua terra. Deus quer que você seja frutífero.
A questão não é: “Quanto ainda
posso fazer nos anos que me restam?”. A questão é: “Como posso me preparar numa
entrega total para que minha vida seja frutífera?”.
Nossa vida é humana, pequena.
Porém aos olhos Daquele que nos chama de amados, somos grande, maiores do que
os anos que temos. Produziremos frutos, frutos que você e eu não veremos nesta
terra, mas nos quais podemos confiar.
Solitude, comunidade, ministério,
essas disciplinas nos ajudam a viver uma vida frutífera. Permaneça em Jesus; ele
permanece em você. Você produzirá muitos frutos, você terá grande alegria, e
sua alegria será completa.
HENRI NOUWEN, escritor e orador, era um membro da comunidade Daybreak (Alvorecer) no Canadá, onde
cuidou de um adulto excepcional por vários anos antes de falecer em 1999. Jornal
Leadership (Liderança), primavera de
1995: 81-87.
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